AGRADAR OU NÃO, EIS A QUESTÃO! (Gilberto Cardoso dos Santos)
Ao construir o poema "Nietzsche Atualizado", lembrei de um educador, Mestre em Física. Enviei-lhe a estrofe sem no entanto solicitar opinião, mas ele deu um feedback positivo e resolveu partilhá-la em seus grupos. Algo inesperado, porém, ocorreu. Ele me trouxe a má noticia:
- Gilberto, eu mandei seu poema aí para um amigo meu e acho que ele não compreendeu a ideia e disse que você era muito presunçoso. Estava se comparando a Nietzsche, estava muito longe de ser Nietzsche... o que é que você tem a dizer a ele?”
Fiquei triste pela apreciação negativa, mas respondi assim:
- Amigo, diga a ele que eu concordo com a parte final. Estou muito longe de ser semelhante a Nietzsche. Quanto à pretensão de querer ser Nietzsche, ele errou nesse ponto. Mas qualquer coisa que nós escrevemos está sujeita a três reações: indiferença, admiração ou desprezo. É uma reação natural que cada um tem de acordo com a sua percepção do que foi escrito.
- Gostaria muito que se você explicasse para ele, qual foi o seu objetivo, quando escreveu esse poema.
- Não se incomode com isso não, meu querido. Você sabe que todo escritor está sujeito a ser ou não aceito. As pessoas vão de alguma maneira se apegar ou não ao texto. O próprio Nietzsche tem seus escritos amados por uns e odiados por outros. Ora, quanto mais eu, reles poeta sem muitas pretensões! Este poema tem a ver com um aforismo dele que diz: “Quando se olha muito tempo para um abismo, o abismo olha para você.” Eu apliquei isso para o conhecimento que nós temos hoje em relação aos buracos negros. Esquente com isso não. Foi melhor ele ser sincero com você a respeito que aplaudir pra lhe agradar. Talvez isso revele uma boa qualidade nele.”
Meu amigo confirmou que ele era, de fato, sincero. Não lhe disse então, mas pensei comigo que o desconhecido aparentava ser uma dessas pessoas excessivamente emotivas, precipitadas no falar. Ora, havia me julgado sem conhecer-me, com base num único poema, sem levar em conta que devemos separar o escritor do eu poético. Perguntava-me: Não seria ele um religioso?
Por mim a coisa estava encerrada, conformara-me com seu juízo, mas meu leitor não estava satisfeito e prosseguiu a discordar respeitosamente do colega. Disse-lhe:
“Você não entendeu. Ele fez o oposto do que você está pensando. Totalmente o oposto.
Segundo Mortimer Adler, existem quatro níveis de leitura, consequentemente, de interpretação.
Nível 1: leitura elementar
Nível 2: leitura averiguativa ou inspecional
Nível 3: leitura analítica
Nível 4: leitura sintética
O nível 4 é o mais complexo, trata-se da análise comparada de obras literárias. Quando digo obra literária, incluo toda forma de manifestação intelectual: música, pintura, escrita...
Ele fez uma síntese brilhante de estudos sobre buraco negro, teologia, a obra do autor supracitado. Tudo isso numa ironia com a situação vigente em nosso país.
Estudo comparado:
Buraco negro é uma região do espaço-tempo em que o campo gravitacional é tão intenso que nada — nenhuma partícula ou radiação eletromagnética como a luz — pode escapar dela. (Esse você conhece muito bem)."
Agradeci a Nelson Almeida pela generosa e desnecessária porém brilhante defesa . Acrescentei:
- Talvez seu amigo tenha estranhado o título do poema. Tive dificuldade quanto a isso, pois de algum modo queria deixar clara a ponte com o aforismo nietzscheano.
- Provavelmente. Ele também é religioso.
Ao ter ciência de sua religiosidade, entendi melhor sua reação.
Fazer poemas, meu amigo, é como construir espelhos. Estes podem ter defeitos próprios, distorcer a realidade das coisas, mas podem também apenas mostrar o que quem nele se mira não gostaria de ver. A pouca visão de quem nele fixa o olhar também pode atrapalhar a apreciação.
Encerro dando um conselho a quem quer se aventurar na escrita: não se intimide diante das críticas, nem se deixe levar pelos elogios, pois nem todos serão verdadeiros. Desagradar também faz parte do ofício. A crítica, ainda que negativa, é melhor que a indiferença.
Agradar ou não, eis a questão, mas o importante mesmo é agradar-se.
Agradar ou não, eis a questão, mas o importante mesmo é agradar-se.
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